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  • 1964 - O Treze F.C. e a administração do dr. Sebastião Pedrosa, filho de Barra de São Miguel - PB.

    "Sebastião Pedrosa, seu atual presidente, homem de grande visão, sentiu que o clube não poderia continuar vivendo do prestígio de sua equipe de futebol e de glórias do passado": esta é uma das referências ao médico barrense, dr. Sebastião Pedrosa, que radicou-se em Campina Grande e durante certo período da década de 1960 foi presidente do Treze Futebol Clube, um dos maiores do Estado da Paraíba. 
    Nesta matéria do Diário de Pernambuco, de 22 de março de 1964, vejamos os planos deste "homem de grande visão" que à época lançava títulos patrimoniais do clube e apresentava para os torcedores alvinegros do "Galo da Borborema" os planos de construção de um "estádio de grande capacidade e dentro dos requisitos da arquitetura moderna", além da "construção da sede social, que terá de tudo para o deleite de seu corpo social: salão de jogos, salão de reunião, conferencias, auditório, "dancing", secretaria, tesouraria, diretoria; um estádio aquático, quadra de tênis e ginásium coberto, além de um "play-ground" para a criançada".

    Vejamos uma imagem desta obra e, a seguir, a matéria completa:


    A notícia completa:

    "Treze Sonha Com O Sucesso Lançando Campanha Para Construir A Maior Praça De Esporte Da Paraíba.
    O Treze, de Campina Grande, é uma das mais prestigiosas agremiações futebolísticas do nordeste brasileiro. Seus feitos são incalculáveis. Os campinenses, no entanto, desejam o clube numa amplitude maior, com maior patrimônio social e esportivo; e por essa razão, o famoso "Galo da Borborema" resolveu crescer. O plano é ousado, porém o arrojo da família alvi-negra da "Rainha da Borborema", característica do homem nordestino, transformará o clube numa potencia.

    Sebastião Pedrosa, seu atual presidente, homem de grande visão, sentiu que o clube não poderia continuar vivendo do prestígio de sua equipe de futebol e de glórias do passado. Outras modalidades esportivas e o campo social também deveriam ser conquistados pelo alvi-negro. A princípio, a ideia era uma miragem: agora já começa a transformar-se numa realidade. O lançamento dos títulos patrimoniais permitirá a realização do plano.

    HISTÓRIA

    A vida do Treze é uma vida de glórias, de conquistas, de vitórias. Seus feitos são por demais conhecidos do público brasileiro. Sua liderança no mundo futebolístico paraibano é uma realidade. Os trezianos vibraram, vibram e vibrarão com as conquistas do famoso "galo". O clube acompanhou paulatinamente o progresso e o desenvolvimento de Campina Grande. Sua história é quase a história da cidade centenária, pois a data de sua fundação é quase a data em que começou a arder na cidade a chama do desenvolvimento. Fundado a 7 de setembro de 1925, o Treze jamais parou em sua marcha para a conquista de vitórias. Cada ano, para o alvi-negro é um ano de triunfos. Campeão paraibano em 1939 - 40 - 41 - 42 - 44 e 50, e campeão de Campina Grande de 1925 - 26 - 27 - 28 - 40 - 41 - 42 - 43 - 45 - 47 - 48 - 49 - 52 - 56 - 57 - 58 e 59, decidiu agora, em 1964, tomar do Campinense Clube, seu competidor, o laurel.  E para conseguir tal feito, seus dirigentes não estão medindo sacrifícios. O que interessa ao clube é a volta da liderança futebolística da Paraíba, custe o que custar.

    PROJETO

    Instalado no bairro de São José, na zona urbana da cidade, o Treze domina uma área superior ao terreno do Náutico, e quase igual a do Esporte. Vive atualmente voltado para o futebol, e mesmo assim tem um quadro social superior a 1.200 associados. A Campanha dos títulos patrimoniais permitirá ao clube melhorar sua praça de esportes, dando a cidade um estádio de grande capacidade e dentro dos requisitos da arquitetura moderna. Os títulos patrimoniais permitirão, ainda, a construção da sede social, que terá de tudo para o deleite de seu corpo social: salão de jogos, salas de reunião, conferencias, auditório, "dancing", secretaria, tesouraria, diretoria; um estádio aquático, quadra de tênis e ginasium coberto, além de um "play-ground" para a criançada.

    OBRAS

    Muito embora somente no próximo mês seja lançada oficialmente a campanha dos títulos patrimoniais, serão iniciadas, ainda este mês, a concentração permanente, ao lado do novo estádio; um alojamento para as delegações visitantes, dotado de dormitório e restaurante, e as torres para a nova iluminação. As obras estão orçadas em vários milhões de cruzeiros, e segundo o pensamento do sr. Sebastião Pedrosa dentro de dois anos o Treze estará com 70% de suas novas instalações completamente prontas.

    FUTEBOL

    Ao lado da preocupação de nova campanha, os dirigentes trezianos estão cuidando da equipe de futebol, pois está dentro dos planos a conquista do campeonato do centenário. Por isso, a organização de uma grande equipe de futebol está sendo preparada. Acreditam que investirão cerca de 25 a 30 milhões de cruzeiros, que ao final esperam ser reembolsados, não só com a conquista do título, mas também, com a renda de jogos amistosos, temporadas, excursões e a Taça Brasil. A chefia do departamento está entregue ao ex-futebolista Buarque Gusmão, ex-dirigente do Campinense, que antes de ter dirigido outra agremiação, foi do Treze, como jogador e diretor". 

    Por fim, segue o recorte completo da notícia:


    Filho de Joaquim Ulisses Pedrosa (Quincas Pedrosa) e Francisca Pedrosa, dr. Sebastião, nasceu no dia 29 de maio de 1927, na Fazenda Pedras Altas, zona rural barrense. O mesmo faleceu em 04 de janeiro de 1971, sendo seu corpo sepultado no cemitério São Miguel de Barra de São Miguel - PB. Na matéria "Dr. Sebastião Pedrosa: Fragmentos de sua trajetória no Diário da Borborema" (que pode ser acessada neste link)  o leitor poderá conhecer mais um pouco de sua história.

    João Paulo França, 25 de junho de 2018

    Fonte:

    Diário de Pernambuco, nº 67, Ano 139, de 22 de março de 1964.

    1986 - 2018: Barra de São Miguel e sua história de sucesso nos Jogos Escolares Paraibanos.

    O amor da população de Barra de São Miguel pelo esporte vem de longa data, em especial a partir dos campos de terra batida. Todavia, a partir da década de 1980 novas modalidades esportivas foram acrescentadas na educação física escolar e passaram a fazer parte do cotidiano local.
    Atuando no município de Barra de São Miguel desde agosto de 1986, o professor Geraldo Mazelo Galdino Campos foi o pioneiro nesta transformação e, após a década de 1990, com a inauguração da Quadra de Esportes José Benjamim, o mesmo formou diversas gerações de amantes do esporte na cidade. Neste ano de 2018, o "professor Geraldo", como é carinhosamente conhecido pelos estudantes e moradores, mais uma vez eleva o nome do esporte escolar local e coloca a Escola Municipal João Pinto da Silva (EMJPS) na 1ª posição entre as escolas públicas nos jogos escolares paraibanos da 3ª Região de Ensino. É um pouco desta trajetória que apresentamos a seguir:

    Imagem 1 - Estudantes da EMJPS nos Jogos Paraibanos 2018 -Etapa Final em Campina Grande
    Neste ano de 2018, os Jogos Escolares Paraibano contaram com a presença de 128 escolas das diferentes redes da 3ª Região de Ensino (municipais, estaduais e particulares). A primeira fase da competição foi setorizada, com os campeões locais disputando a etapa final na cidade de Campina Grande. Nos diz o professor Geraldo que a Escola Municipal João Pinto da Silva de Barra de São Miguel disputou a primeira fase dos jogos na cidade de Cabaceiras, no mês de maio.  Na ocasião, a equipe barrense não tomou conhecimento de seus adversários e aplicou históricas goleadas: no primeiro jogo, contra estudantes de Cabaceiras o resultado foi 7x1. Contra os alunos de Boqueirão o placar foi 7x0. No terceiro jogo, contra estudantes de Barra de Santana, o placar foi 12x0. Encerrando a primeira fase e confirmando o primeiro lugar na etapa, os meninos de Barra de São Miguel venceram Caturité por 11x1.

    Imagem 2 - Estudantes da EMJPS nos Jogos Escolares Paraibano 2018 -Etapa Inicial em Cabaceiras
    Com a classificação na etapa inicial garantida, os alunos da escola João Pinto da Silva voltaram sua atenção para a etapa final, realizada ao longo da semana de 04 a 08 de junho na cidade de Campina Grande. Mais uma vez excelentes resultados foram alcançados.
    No primeiro confronto, os estudantes barrenses venceram a escola particular campinense Carmela Veloso pelo placar de 4x1. No segundo jogo, mais uma vitória, desta feita contra a escola particular Petrônio Figueiredo, por 1x0. Tais resultados credenciaram a escola João Pinto da Silva para a disputa das semifinais, onde foram derrotados pela escola particular Motiva de Campina Grande, por 3x0. Tendo em vista que na outra semifinal a escola pública Estadual da Liberdade perdeu de goleada para outra escola particular, os meninos do João Pinto da Silva podem ser consagrados como a melhor escola pública dos Jogos Paraibanos de 2018 na 3ª Região de Ensino.

    Imagem 3 - Década de 1990. Estudantes da EMJPS nos Jogos Escolares - Etapa Final em Campina Grande
    Como mencionado, os resultados expressivos deste ano de 2018 são um belo resgate de uma história de sucesso nos Jogos Escolares Paraibanos. Na década de 1990 o professor Geraldo comandou em jogos muito disputados no ginásio "O Meninão", em Campina Grande, uma geração de atletas escolares que se tornaram vice-campeões na 3ª Região de Ensino, só perdendo na final por 4x3 para uma escola particular campinense, ou seja, os mesmos se tornaram na época a melhor escola pública em sua categoria.

    Imagem 4 - Meninas da EMJPS nos Jogos Escolares de Barra de São Miguel
    Ainda na década de 1990, as meninas de Barra de São Miguel sob o comando do professor Geraldo chegaram a semifinal dos jogos paraibanos em Campina Grande e ficaram em 3º lugar geral na categoria handebol da 3ª Região de Ensino.

    Imagem 5 - Professor Geraldo e Hiago Truta
    Na imagem 4 vemos a equipe de Handebol campeão dos jogos internos da Escola João Pinto da Silva no ano de 1992 e que foi base para a seleção que disputou a etapa de Campina Grande.
    Parabenizamos as diferentes gerações de atletas escolares de Barra de São Miguel que com muito esforço construíram esta história. Em especial, lembramos o professor Geraldo que chega neste ano de 2018 aos 32 anos de exercício da profissão de educador físico nas diferentes escolas de Barra de São Miguel: ao mesmo o nosso agradecimento e felicitações pelas conquistas.

    João Paulo França, 08 de junho de 2018


    Fonte:

    Imagens e informações do professor Geraldo Mazelo Galdino Campos.

    Cândido Casteliano: Biografia escrita por José Silvio Gomes

    Cândido Casteliano: a nomenclatura da avenida principal de Barra de São Miguel nos dias atuais, todavia, quem foi este personagem histórico? Qual sua ligação com a cidade? Em que época viveu? Qual ou quais os seus legados? Estas e outras questões podem ser respondidas a partir do texto biográfico produzido pelo pesquisador José Silvio Gomes, que se encontra exposto no Museu Municipal David Ferreira. A seguir, expomos imagens de Cândido Casteliano e sua residência em Barra de São Miguel:

    Imagem 1 - Acervo do Museu Municipal David Ferreira

    Vejamos a imagem e a transcrição do texto "Cândido Casteliano", escrito em 2005 por José Silvio Gomes:
     

    CÂNDIDO CASTELIANO

    Nasceu em 03 de outubro de 1875, no povoado de Barra de São Miguel, distrito de Cabaceiras, na então província da Paraíba era filho de Marçal Bezerra da Silva e Joaquina Maria de Jesus, mais conhecida por Tininha, eram seus irmãos, Joaquim Marçal, João Marçal, Mássimo Bezerra, Marcelino e Maria Joaquina da Conceição, também chamada de Mariazinha, esta se casou com Francisco Pinto da Silva, originando a família Pinto da Barra de São Miguel.
                Cândido se casou com Bazilissa, ela com 19 anos e ele com 20 anos, o casamento realizou-se na Capela de São Miguel, no ano de 1895.
                Cinco anos depois, no ano de 1900, nasceria um menino batizado com nome de Luiz e dois anos depois uma menina que a família chamava de Lalinha. Ambos nasceram na casa de residência do casal, a primeira casa construída no início da rua mais estreita, já que só havia uma única rua na vila da Barra de São Miguel, esta bastante larga. Atualmente é a primeira casa da rua Thomas de Aquino, situada em frente ao prédio da Prefeitura Municipal.
                Era o mais importante comerciante da vila e na sua loja anexa a casa residencial vendia fazendas (tecidos), miudezas (aviamentos), ferragens e outros bens de consumo da época. Exercia o cargo de delegado de polícia na vila de Barra de São Miguel, quando no dia 21 de maio de 1906, foi vítima do famigerado cangaceiro Antônio Silvino, que o manteve refém durante horas, com um punhal na sua garganta e estava decidido a sangrá-lo, mas a súplica, que de joelhos sua mãe fizera diante do cangaceiro o salvou a vida.
                Solicitou ao governo estadual uma força militar, mais bem equipada e com mais homens, capaz de perseguir e prender Antônio Silvino, mas não foi atendido.
                Desprestigiado pelo próprio governo ao qual servia, entregou o cargo de subdelegado e preocupado com a sua segurança pessoal, já que a diminuta força policial da vila não teria condição de conter um novo ataque dos cangaceiros. Neste mesmo ano de 1906, vendeu todos os seus bens imobiliários e em companhia da sua mulher e dos seus dois filhos, deixou definitivamente a vila da Barra de São Miguel e foi morar na cidade de Patos. Do ponto de vista comercial foi uma decisão acertada, sobretudo pela posição geográfica magnífica desta cidade, sem igual no sertão da Paraíba. No período de 1909 a 1932, Patos passou de 173 para 1.110 casas, cresceu em média 8,42% ao ano, de todas as cidades da Paraíba, só Campina Grande teve crescimento semelhante, passou de 820 para 5.257 casas, cresceu 8,41% ao ano, enquanto a vila de Cabaceiras, passou de 95 para 155 casas, cresceu em média 2,15% ao ano.
                Bazilissa faleceu aos 37 anos de idade, na cidade de Patos, no ano de 1913, deixando órfãos os menores, Luiz com 13 anos e Lalinha com 11 anos e ele viúvo aos 38 anos de idade. Não sabemos de voltou a casar novamente.
                No ano de 1917 Luiz cursava o ensino médio na capital paraibana, também chamada Paraíba, sendo escolhido o melhor aluno entre os 334 do Colégio Diocesano Pio X, onde era um dos internos, foi laureado com a medalha do mérito escolar, que recebeu das mãos do presidente da Paraíba de então, Camilo de Holanda. Neste educandário foi colega de Firmino Leite, Oswaldo Trigueiro, Alcides carneiro e outros. Posteriormente foi estudar medicina no Rio de Janeiro, onde se formou no fim do ano de 1926, casou-se com Irma, uma portuguesa radicada no Brasil, tiveram filhos, morou e clinicou na cidade maravilhosa, onde morreu nos fins dos anos 80 do século passado, mas nunca esqueceu a casa onde nasceu e morou até os seis anos, a Capela de São Miguel e o cruzeiro da sua frente, este segundo Cândido era a obra de seu irmão Mássimo, o único marceneiro da Barra no fim do século XIX. As lembranças da sua terra querida, as quais traduziu em versos estão no livro Castelo de Ilusões, publicado no ano de 1971.
                Ainda em vida, Cândido teve a grande alegria de saber, que seu filho Luiz concluíra o curso de medicina, o primeiro da cidade de Patos, como também o primeiro filho da Barra a formar-se médico.
                Morreu na cidade de Patos, aos 57 anos de idade, no ano de 1932

    Por: José Silvio Gomes, Santa Cruz do Capibaribe, 26 de setembro de 2005


    Tem mais informações ou imagens sobre a história de Barra de São Miguel? Divida conosco: joaopaulo_franca@yahoo.com.br ou (83)988019451

    João Paulo França, 12 de maio de 2018.

    Fonte:

    Acervo do Museu Municipal David Ferreira. Texto "Cândido Casteliano" de José Silvio Gomes.

    1889 - Potira e Caturité: a versão de Irineo Joffily.

    POTIRA: um nome pelo qual muitos moradores de Barra de São Miguel-PB se perguntam de onde adveio e porque nomeou a cidade entre 1943 e 1960. Nesta data nosso portal apresenta uma versão desta lenda(?) escrita ainda no século XIX, por Irineo Joffily. 
    Sobre Barra de São Miguel continuamos a investigar, tendo em vista que a bela composição a seguir não é elucidativa...

    Antes de fazermos a leitura, o editor da obra nos dá a seguinte pista sobre esta história que tem por título "CATURITÉ":

    "Esta ingênua composição literária, muito inspirada na Iracema de José de Alencar, foi publicada em três capítulos na Gazeta do Sertão de 11, 18 e 25 de janeiro de 1889, aparecendo logo depois em folhetim, sob o nome I. Jorrily, bastante divulgado na Paraíba. Um exemplar deste folhetim foi deixado pelo próprio autor na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em 1892. Em 1917, o padre cearense Heliodoro Pires publicou em minas um pequeno folheto com o título de “A Iracema Paraibana”, repetindo com suas palavras a mesma composição, mas ressalvando, “que foi o Dr. Joffily quem recolheu esta lenda”. No O Cruzeiro de 30 de julho de 1955, Gustavo Barroso também repete mesmíssimo tema, com o título de “Morte Heróica de Potira e Caturité”, não indicando a fonte, como era o seu hábito. G. I. J."

    Ilustração de Tônio - Jornal A União de 03 de abril de 2009


    CATURITÉ

    I

    Em julho de 1867, viajando de Cabaceiras para a povoação da Barra de Sta. Ana, então vila de Bodocongó, tive ocasião de ver de perto o elevado pico do Caturité.
    Fazia a viagem em companhia do distinto juiz de direito da comarca de S. João, Dr. Reinaldo Francisco de Moura, depois desembargador da Relação do Maranhão.
    A estrada acompanha sempre o rio Paraíba, passando pela legendária povoação de Boqueirão, onde ainda via-se as ruínas de um antiquíssimo edifício, que uns dizem ter sido um convento, e outros que fora o castelo ou residência do famoso capitão-mor Theodósio de Oliveira Ledo, célere nas guerras contra os indígenas, no princípio do século passado, e conquistador do Cariri.
    Boqueirão, povoação inteiramente decadente, tira o seu nome da solução de continuidade que, no lugar, apresenta a serra do Facão ou de Cornaió, rompida pelo rio. É um lugar muito apropriado para um imenso açude, muito superior ao Quixadá no Ceará.
    Logo que transpusemos a serra, inopinadamente avistamos em nossa frente, a leste, o Caturité, elevando-se isolado e altaneiro da pequena cordilheira que lhe serve de base.
    - Eis o Caturité! Bonito monte! Exclamou o meu companheiro.
    - E bonito nome; acrescentei. Mas o que significará na língua indígena a palavra Caturité? Quem sabe se ela não marcará importante época na vida desse povo selvagem, que os portugueses exterminaram?!
    - É bem possível!...Indague que há de desvendar o mistério que talvez envolva o nome deste monte.
    Volvemos ao silêncio; e continuamos a viagem por muito tempo, contemplando o Caturité, até que o deixamos à nossa esquerda.
    No mesmo dia chegamos à pequena vila de Bodocongó.
    O dr. Reinaldo de Moura entrou logo nos seus trabalhos judiciários de julgamentos criminais, definitivos e perante o júri; e eu tratei sem demora de organizar uma excursão ao Caturité.
    Um amigo, o sr. Japiá, ofereceu-se logo para meu companheiro, prestando-se também a contratar um guia e mais dois homens armados para o que fosse preciso.
    Na manhã seguinte deixei a vila e tomei o caminho da serra com meus companheiros. Transposto o rio Bodocongó, que ali faz barra no Paraíba, e vencida mais uma légua e meia de caminho, principiou a subida. Em menos de uma hora alcançamos a chapada da serra.
    A vegetação mudou logo, mostrando-se o terreno muito apropriado para a agricultura. Em uma casa de fabrico de farinha, eu e o meu amigo Japiá apeamo-nos e deixamos os nossos cavalos.
    Estávamos ao pé do pico do Caturité, que se elevava majestoso, coberto de frondoso arvoredo. Não havia uma picada, um trilho sequer, pelo qual nos dirigíssemos. O guia tomou a dianteira e nós o seguimos. A subida foi difícil; fomos ganhando terreno, segurando-nos de árvore em árvore, até galgarmos o cimo do monte.
    Vastíssimo horizonte se patenteou aos nossos olhos. Ao sul via-se a serra de Taquaritinga, na distância de umas doze léguas, e toda essa cordilheira que divide a Paraíba de Pernambuco, até unir-se à serra de Jacarará ao sudoeste.
    Ao poente, diversos montes à grande distância; e mais perto a serra de Cornaió e outras, ficando debaixo de nossas vistas a povoação de Boqueirão.
    Ao norte a serra Bodopitá, avistando-se por cima dela a cidade de Campina Grande e mais além as elevações de terreno, onde assenta a cidade de Areia.
    A leste as serras, onde estão os brejos de Natuba, Guapaba e Pirauá, azuis pela distância e pela virente vegetação que as cobre, e mais perto as de Guaribas e Uruçu.
    O rio Paraíba em seu sinuoso curso, traçado de poente a nascente, destaca-se como uma imensa faixa esbranquiçada, onde se vê brilhar aos raios do sol alguns poços e um tênue fio d’água no meio das areias do seu leito.
    O Caturité, pelo lado ocidental, é inacessível, havendo uma enorme rocha talhada a pique, descobrindo um medonho abismo de muitos metros de profundidade.
    Depois de demorar a vista por mais de uma hora no vasto panorama, acolhemo-nos à sombra de um frondoso jucá, e em seu tronco liso eu e o meu amigo Japiá gravamos com um canivete os nossos nomes e a data de nossa ascensão.
    Enquanto isso fazíamos, o guia e seus companheiros cortaram uma umburana e de seu tronco oco tiraram um grande e delicioso favo de jati, que saboreamos à moda indígena.
    A descida, embora me parecesse mais difícil do que a subida, foi feita sem o menor acidente. Segurando de árvore em árvore, algumas vezes rojando o dorso no solo escorregadio e em posição quase vertical, chegamos à base do monte. Montamos a cavalo e nos recolhemos à vila.
    Cada vez mais curioso por saber a história ou lenda a que se prende o nome de Caturité, indaguei de algumas pessoas e nada consegui que me satisfizesse.
    - Catu na língua geral dos indígenas do Barsil, segundo o dicionário de Gonçalves Dias, significa – bom -, e – retê – grande, ilustre.
    José de Alencar, em sua inimitável lenda-poema, - Iracema -, é da mesma opinião, decompondo a palavra – Baturité, em – ba-tuire-eté – narceja ilustre; apelido que tomara um chefe potiguara, valente nadador.
    Eu presumia que os dois qualificativos – bom e ilustre -, tradução da palavra Caturité, referiam-se a algum chefe dos índios cariris.
    Mas como saber?

    II

                Decorreram quinze anos.
                Um dia, passando pela serra de Fagundes ou de Bodopitá. Descansei alguns momentos na modesta casa do velho C., donde se via perfeitamente o Caturité, em distância de cinco para seis léguas. Fitando o majestoso monte, exclamei:
    - Não conhecer eu a história daquele nome!
    - Qual nome? – perguntou-me o velho.
    - Daquele monte, Caturité.
    - Eu a conheço; - respondeu ele.
    Encantado por esse fortuito encontro que viria resolver, aliás, explicar uma palavra para mim tão misteriosa, roguei, instei com o pobre roceiro para que, reconcentrando o seu espírito, contasse fielmente a história, não omitindo nenhum dos pormenores conservados pela tradição.
    Guardando silêncio por alguns momentos, o ancião começou:
    - Já faz muito tempo. Meu avô presenciou; a meu pai ele contou o que viu e meu pai contou a mim. Esta serra coberta de matas virgens e cheia de fontes d’água, era habitada pela tribo Bodopitá, uma das mais valentes da raça cariri.
    Os brancos da Paraíba e da missão do Pilar dominavam, até o pé da Borborema, nunca a tinham subido. Eram para eles regiões desconhecidas e tenebrosas.
    Foi quando os portugueses, querendo estender o seu domínio, encarregaram o Capitão-mor, Theodósio de Oliveira Ledo, de conquistar o sertão.
    Caturité, bom e grande entre os seus e chefe da tribo Bodopitá, deu o alarme entre as tribos irmãs e provocou o levante geral contra o comum inimigo.
    Muitos combates renhidíssimos foram dados, e os portugueses sempre venceram.
    O que valiam as flechas dos pobres indígenas contra as armas de fogo dos seus inimigos?
    Subindo pela margem esquerda do rio Paraíba, o capitão-mor aproximou-se desta serra e em um último combate exterminou a tribo Bodopitá.
    Caturité não morreu, apesar de ter muitas vezes afrontado a morte e de ser o último a abandonar o campo, cheio de ferimentos retirou-se e foi acolher-se nos esconderijos do alto monte, a que deixou o nome.
    Depressa sararam as feridas do seu corpo; mas as d1alma sangravam e sangrariam sempre, sobretudo porque Potira, sua estremecida filha era prisioneira dos portugueses.
    Potira, a virgem cariri, singela e bela como a bonina, (*)[1] acompanhou com os demais prisioneiros o exército do capitão-mor até Boqueirão, onde ele estabeleceu o seu arraial.
    Caturité do seu elevado posto viu a marcha dos inimigos, viu o seu acampamento, viu finalmente que seria cercado e não quis fugir para os Sucurus, a tribo irmã, que podia ainda organizar forte resistência. Preferiu ficar para salvar a filha e fugir com ela ou então morrer.
    Era noite escura. O rio Paraíba estava cheio. Caturité desceu o alcantilado monte e atravessando o rio a nado, alcançou a margem direita, e por ela seguiu até que descobriu os fogos do arraial inimigo.
    Orientou-se, e segunda vez lançou-se n’água, atravessou um braço do rio, tomando pé em uma ilha, próxima à margem esquerda, onde se achavam os portugueses. Ali chegando com infinitas precauções, subiu a uma elevada craibeira e por entre as suas densas ramagens lançou o olhar sobre todo o arraial.
    Na encosta de um oiteiro, em terreno pedregoso, havia o Capitão-mor assentado o seu acampamento. Na frente tinha o rio; à direita, na direção do poente, estava a serra Cornaió. Eram os dois lados por onde poderia ter atacado; e, por isto, como guerreiro experiente, escolheu um terreno, guardado por duas linhas naturais de defesa, para o seu arraial.
    Já havia dias que Oliveira Ledo chegara. O arraial formava um grande quadrilátero, tendo no centro a espaçosa tenda do Capitão-mor, e nas suas quatro faces via-se ao pé de árvores as toscas palhoças dos soldados, que não dispunham de tendas, como o seu chefe.
    No meio do campo existiam a pequenos espaços grandes baraúnas e aroeiras. Fora, a caatinga era tão fechada pelo caroá, macambira e chique-chique, cobrindo inteiramente o solo nos espaços deixados por árvores e arbustos, que era difícil penetra-la.
    À noite, grandes fogueiras circulavam o campo, medida necessária para afugentar as feras; e soltavam-se os cães, amestrados nessas guerra contra os indígenas, e que eram sentinelas mais vigilantes do que os próprios soldados.
    Muitos prisioneiros tinha feito o Capitão-mor nos diversos combates, que dera contra os cariris. A presa já era importante e tornava-se preciso cumprir a lei, isto é, tirar-se os quintos para El Rei.
    Os prisioneiros foram entregues aos cuidados de um frade, que acompanhava a bandeira, perito no dialeto cariri, afim de doutrina-los.
    Potira, pela sua mocidade, pela sua beleza e sobretudo pela sua origem, mereceu especial atenção de Oliveira Ledo e do religioso, o qual, admirado da penetração de seu espírito, até então cercado de espessas trevas, esforçava-se pela sua conversão.
    Naquela noite o religioso continuava o seu ensino aos catecúmenos, e, depois de explicar a formação do mundo, o dilúvio universal, o modo porque Noé foi salvo e a vinda do Messias anunciado, levantou a imagem do crucificado e apresentou-a à Potira, dizendo:
    - Eis o nosso Deus! (Tupã) (*)[2]
    - Pagé dos brancos, - respondeu ela – Tupã é o poderoso no céu, manda o trovão e o raio contra a terra, e não pode ser morto em uma cruz, como este vosso Deus.
    - O nosso pagé,  - continuou ela – diz que Tamandaré foi salvo do dilúvio no olho de uma palmeira que flutuou sobre as águas.
    O religioso, constrangido e ao mesmo tempo admirado de semelhante raciocínio e da tenacidade com que a jovem indígena sustentava as suas absurdas crenças, empregou todos os meios de conversão explicando os mistérios por meio de comparações e imagens, afim de ser mais facilmente compreendido. Ao mesmo tempo fez-lhe promessas as mais sedutoras.
    Potira ficou perplexa. O religioso insistiu; e ela ia responder, quando ouviu ao longe o lúgubre canto do oitibó. Sobressaltou-se e disse depois de uma pausa:
    A filha de Caturité só pode seguir religião de seu pai; debalde insistis, pagé dos brancos, para que a deixe.
    O religioso, sumamente penalizado pela inutilidade de seus esforços, por supor que aquela alma não quereria, nunca, deixar o erro e aceitar a luz da verdade, deu por finda a prática naquela ocasião, mandando retirar os seus catecúmenos.
    Potira e seus companheiros, algemados e presos uns aos outros com fortes cordas de caroá, dirigiram-se escoltados para as proximidades de uma fogueira, onde sentaram-se em círculo.
    Súbito ouve-se de novo o canto do oitibó, parecendo agora partir de uma baraúna, em que Potira se recostara.
    Cessaram todos os rumores. O arraial dormia.

    III

    Caturité, dominando todo o campo inimigo do cimo da caraibeira, onde estava, viu à luz de uma fogueira os prisioneiros e entre eles Potira, a quem o religioso dirigia a palavra. Então imitou o canto do oitibó para anunciar a sua presença.
    Depois viu que os prisioneiros se retiravam e que tomavam posição um pouco adiante. Foi quando ouviu repetido o canto que soltara.
    Tinha agora a certeza de ter sido compreendido por sua filha. Esperou, Passado algum tempo, desceu da árvore, entrou no rio e mergulhando surgiu na margem oposta.
    Não se levantou; a posição horizontal, que guardava n’água, conservou em terra. De bruços deslizou sobre o solo, sem que se ouvisse o choque de qualquer pedra, que se deslocasse ou o atrito de seu corpo sobre a erva.
    Imperceptivelmente ganhou terreno aquele vulto, que se dizia imóvel, até que atingiu um penhasco isolado, à pequena distância do arraial. Lá chegando, levantou-se, amparado da pedra e de novo fez ouvir o canto do oitibó.
    O som agora tinha variado. A ave notívaga tem a propriedade de expedir sons vagos, indeterminados, quando vôa, parecendo, assim, dar o anúncio de sua passagem. Quando, porém, pousa, o seu canto muda; a sua voz lúgubre torna-se acentuada.
    Assim, o oitibó tinha agora soltado o seu canto em tom breve e imperativo, como se quisesse dizer:
    - Vem!...vem!...

    IV

    Decorreu o espaço de alguns minutos.
    De repente a esbelta figura da jovem indígena revelou-se, e Potira, lançando-se nos braços de Caturité, diz:
    - Eis tua filha, Caturité! Mas fujamos, que os brancos nos perseguem.
    O momento era crítico. O chefe cariri tinha formado o plano de fugida, atravessando com sua filha o Paraíba, naquela ocasião barreira insuperável para os seus inimigos; mas vendo os pulsos de Potira presos com algemas, conheceu logo a impossibilidade de pôr em execução o seu plano.
    Tomou então a resolução de fugir pela margem do rio, até as fraldas da elevada serra, onde era o seu asilo.
    Mais rápida do que a ema do seu sertão, estava agora Potira tolhida em sua carreira; mas, ainda assim, nunca seria alcançada pelos soldados portugueses que a perseguiam, se não fosse os cães, que botaram em sua pista.
    A matilha sendo açulada por seis arcabuzeiros, que a seguiam de longe, alcançou o par perseguido, obrigando Caturité a deixar a margem do rio, penetrando na caatinga, onde poderia melhor defender-se.
    O guerreiro cariri tinha as suas armas, o rígido tacape e o arco com a uiruçaba cheia de setas.
    Entrando na caatinga dois gigantescos cães, mais audazes do que os outros, lançaram-se furiosos sobre eles. Caturité com a maior agilidade duas vezes vibrou o tacape e os prostrou por terra moribundos, sacudindo-os em seguida sobre o resto da matilha, que recuou amedrontada.
    Teve tempo, então, de alcançar um serrote e do seu cimo Potira soltou um grito de alegria:
    - Jaci (*)[3]: - disse ela.
    A lua, no quarto minguante, aparecia agora por trás de uma nuvem já elevada no horizonte. À sua luz Caturité examinou as algemas que prendiam a filha e dispôs-se a quebra-las, muito embora ficassem contusos ou feridos os seus pulsos. Via ser impossível de outro modo a sua salvação.
    Escolheu uma pedra da maior rigidez e usando dela como martelo, conseguiu, sem demora, libertar a jovem indígena da infame prisão.
    Potira vendo-se livre, como o passarinho que alisa as penas para o rápido vôo, ajeitou a sua arassoia (*)[4] e despediu-se em carreira veloz por uma clareira do bosque.
    A matilha continuou a persegui-los; mas já não acometia, esperava que seus senhores chegassem para darem cabo da caça.
    E essa caçada humana, semelhante à do jaguar, continuou pelo resto da noite e com o aparecimento do dia.
    Subindo a serra, já dia claro, Caturité tomou posição ao pé do grande jucá, que ainda lá existe e dispôs-se a exterminar o resto da matilha.
    Uma primeira seta, que disparou, pôs fora de combate um dos cães e o outro que restava abrigou-se por trás de uma árvore no cerrado da mata.
    Nesse momento assomou um dos arcabuzeiros, e Caturité, que já tinha o seu arco preparado, cravou-lhe uma seta na garganta.
    Os outros portugueses apareceram logo e quando o chefe indígena disparou de novo o seu arco, estrondou uma descarga de quatro tiros.
    Potira, ferida no peito por uma bala, inclinou a fronte e ia cair, quando Caturité, soltando um terrível grito, segurou-a, levantando-a em seus hercúleos braços.
    Então recuou alguns passos, sempre com os olhos fitos nos seus inimigos, até que aproximou-se do despenhadeiro.
    Conservando sua filha exânime, reclinada sobre seu ombro e sustentando o seu corpo com um dos braços, Caturité voltou-se rapidamente e dando prodigioso salto, foi cair sobre os galhos de um frondoso jatobá e desapareceu no abismo.
    O ancião fez uma grande pausa e depois disse em conclusão:
    - É a triste história de Caturité. (*)[5]

    Fonte:
    JOFFILY, Irineo. Notas sobre a Parahyba. Brasília: Thesaurus editora. Fac-símile da 1ª edição publicada no Rio de Janeiro, em 1892, com prefácio de Capistrano de Abreu.
    Ilustração do Jornal A União de 03 de abril de 2009 


    [1] Potira, na língua geral, significa bonina, flor. (O asterisco é do próprio autor e confere com o Dicionário da Língua Tupy de Gonçalves Dias, ed. de 1857).
    [2] Tupã, na língua indígena, significa Deus. (Asterisco do texto).
    [3] A Lua. Decompõe-se: já – nós, ci – mãe.
    [4] Vestido de Penas. (os asteriscos são do próprio texto).
    [5] Esta ingênua composição literária, muito inspirada na Iracema de José de Alencar, foi publicada em três capítulos na Gazeta do Sertão de 11, 18 e 25 de janeiro de 1889, aparecendo logo depois em folhetim, sob o nome I. Jorrily, bastante divulgado na Paraíba. Um exemplar deste folhetim foi deixado pelo próprio autor na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em 1892. Em 1917, o padre cearense Heliodoro Pires publicou em minas um pequeno folheto com o título de “A Iracema Paraibana”, repetindo com suas palavras a mesma composição, mas ressalvando, “que foi o Dr. Joffily quem recolheu esta lenda”. No O Cruzeiro de 30 de julho de 1955, Gustavo Barroso também repete mesmíssimo tema, com o título de “Morte Heróica de Potira e Caturité”, não indicando a fonte, como era o seu hábito. G. I. J.