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  • Padre Zuzinha - Série Pela Região

    José Pereira de Assunção, o Padre Zuzinha, nasceu em 07 de abril de 1905, no sítio Várzea Grande, de Taquaritinga do Norte. Ordenou-se padre e chegou em 1938 em Santa Cruz do Capibaribe e, a partir de 1946 se tornou o sacerdote da cidade, sendo bastante respeitado e aclamado pela população local, que o tornou prefeito por duas gestões (1969-1972 e 1977-1982). Aos 78 anos de idade, em 05 de outubro de 1983, faleceu no hospital da cidade de Caruaru-PE.

    Nesta data, apresentamos a seguir, dois documentos históricos sobre o Padre Zuzinha: Primeiro, o cordel "A morte do padre Zuzinha e o desgosto do povo", de autoria de José Luiz. Por fim, a matéria do Diário de Pernambuco intitulada "Mulher que atirou no Padre em Caruaru não é normal", sobre o atentado que o religioso sofreu em janeiro de 1969, na vila do Pará.

         Cordel "A morte do padre Zuzinha e o desgosto do povo", de José Luiz:

    Figura 1 - Capa e Página 1 do Cordel

    Páginas 2 e 3 do Cordel

    Páginas 4 e 5 do Cordel

    Contracapa do Cordel
     

    Matéria do Diário de Pernambuco: "Mulher que atirou no Padre em Caruaru não é normal"

    Jornal Diário de Pernambuco, edição 07, Ano 144, em 09 de janeiro de 1969, p.8

     Segue a transcrição: 

    MULHER QUE ATIROU NO PADRE EM CARUARU NÃO É NORMAL

    CARUARU – (Do Correspondente Antônio Miranda) – A mulher Maria Barros, que desferiu um tiro na coxa direita do Padre Zuzinha, disse ao capitão Abelardo Calumbi, delegado de Jataúba, e designado delegado especial para apurar os acontecimentos de Santa Cruz do Capibaribe, que o sr. Inácio Cesário havia dirigido, durante a última campanha política naquele município, uma carta ao delegado de Barra de São Miguel, na Paraíba, afirmando que três dos filhos de Maria Barros eram do padre-prefeito de Santa Cruz.

    Entretanto, o delegado especial, em conversa com a ex-fã do padre Zuzinha assegura que a mulher é psicopata e que seu marido é débil mental. Segundo afirmações de habitantes de Santa Cruz, o esposo de Maria Barros esteve internado durante longo tempo, numa clínica psiquiátrica.

    A mulher não está dizendo a verdade – afirmou o capitão Abelardo – durante o interrogatório.

    Entrementes, o sr. Clóvis Paca, principal assessor do Padre Zuzinha, desmentiu formalmente que tivesse indicado os nomes dos srs. Raimundo Aragão, José Moura Irmão e Manuel Barbosa como culpados pelos boatos em torno do acontecimento. 

    REVOLVER

    Após o interrogatório, o delegado especial acha que o revolver com que Maria Barros baleou o padre Zuzinha, lhe foi dado por terceiros.

    Na verdade, essa hipótese do capitão Abelardo Calumbi vem confirmar as impressões do sr. Clovis Paca de que os acontecimentos de anteontem têm relação com alguns fatos registrados na campanha política.

    TRÊS TIROS

    Segundo versão do delegado do Pará, sargento José Ramos, a mulher deflagrou apenas três tiros no padre.

    O sargento afirmou que ao ouvir o segundo tiro, dirigiu-se para a praça onde está localizada a delegacia. Lá chegando, viu quando a mulher se preparava para acionar o gatilho pela terceira vez. Num gesto brusco, o militar deitou-se ao chão. Em questão de segundos a mulher, após disparar o terceiro tiro, virou-se para o delegado e acionou novamente o gatilho.

    Ato contínuo, o soldado da guarnição aproximou-se do sargento, e ao lhe perguntar se tinha sido ferido, ouviu o quinto tiro deflagrado por Maria Barros. 

    FUGA

    Ao disparar contra o soldado a mulher correu para a casa da mãe e escondeu-se num quarto. O delegado e o soldado dirigiram-se para a residência e após forçarem a porta do cômodo encontraram Maria Barros com um revolver a mão.

    Após dar ordem de prisão à mulher, os policiais constataram que ainda havia uma bala na arma. 

    PÂNICO

    Quando Maria Barros foi recambiada para Santa Cruz do Capibaribe, a população desta cidade postou-se à frente da delegacia, exigindo que Maria Barros fosse severamente castigada. Entretanto, dotado de grande calma o delegado local, sub-tenente Ivo Belarmino, conseguiu tranquilizar os ânimos, permitindo que as autoridades interrogassem a criminosa.


    Por fim, destaco uma contradição no Jornal Diário de Pernambuco de 08 de janeiro de 1969, onde em sua capa fala que este episódio teria ocorrido "anteontem", ou seja, no dia 06 de janeiro. Já na página 08 fala que o crime foi "cerca das 13 horas de ontem", ou seja, dia 07. Apesar desta contradição de datas, não podemos deixar de compreender que houve este atentado contra o religioso e que o mesmo foi socorrido a tempo e, mesmo ferido, tomou posse no cargo de prefeito de Santa Cruz do Capibaribe-PE naquele ano de 1969.

    João Paulo França, 05 de outubro de 2021.

    Fonte:

    Cordel  "A morte do padre Zuzinha e o desgosto do povo", de José Luiz, s/d.

    Jornal Diário de Pernambuco, edição 07, Ano 144, em 09 de janeiro de 1969, p.8.

    Jornal Diário de Pernambuco, edição 06, Ano 144, em 08 de janeiro de 1969, p.1 e 8.

    JULIÃO, Gilson José. Cultura política em torno da figura de Padre Zuzinha em Santa Cruz do Capibaribe-PE (1968-1986) [manuscrito]. – 2010. 69 f.: il. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História) Universidade Estadual da Paraíba, Centro de Educação, 2010.

    Antônio Silvino em Serra dos Bois, após o ataque à Barra de São Miguel em 1907 (Série Cangaço - nº 4)

    Na noite de 26 para 27 de janeiro de 1907, Antônio Silvino e seu bando executou um bem sucedido ataque à Vila de Barra de São Miguel, que à época era sede administrativa do município de Cabaceiras. Sem cerimônia e com astúcia, os cangaceiros fizeram o delegado Nicolau Vitalino Correia de Araújo refém e, ao atender sua voz, os demais soldados, em um total de quatro, foram rendidos e desarmados em suas residências. 

    Sem reação, rumaram para a casa de Manoel Henrique do Nascimento Araujo, escrivão da Mesa de Rendas, órgão de cobrança de impostos da época, e saquearam os recursos da repartição, queimando em seguida os papeis oficiais. A ação prosseguiu com assalto aos comerciantes e moradores locais, nomeadamente, os senhores Cândido Casteliano dos Santos e Olyntho José de Vasconcelos. Ao final, "solicitaram e tomaram café", já na madrugada, na residência do sr. Manoel Melchiades Pereira Tejo, tabelião e político local.

    Todavia, para onde teria se dirigido Antônio Silvino e o bando após este ataque? O Jornal Pequeno, de Recife, no dia 07 de fevereiro de 1907 nos diz:

    "Antonio Silvino na Serra do Boi"

    Temos notícias frescas sobre Antonio Silvino e seu grupo de cangaceiros.

    Após haver incendiado, - ao seu ódio a tudo quanto cheira a impostos, - a Mesa de rendas do logar Barra de S. Miguel, 8 legoas distante de Taquaretinga, Silvino dirigio-se para o povoado denominado Serra do Boi, 3 ½ legoas apenas da Barra de S. Miguel.

    Em Serra do Boi, Silvino mandou um recado a um alferes policia, de nome Menezes, o qual anda com uma força em seu encalço, dizendo-lhe que estava a sua espera naquele lugar.

    Ao passo que mandava este recado, Silvino destruía em diversos pontos a linha telegráfica entre Bom Jardim e Taquaretinga.

    O sr. Francisco Vieira de Assis, negociante nesse último logar, por este motivo ficou ante-hontem impedido de passar um telegrama para uma casa commercial nesta praça.

    O sr. Amaro Coelho, negociante de Taquaretinga, ao voltar da feira de Gravatá, encontrou-se no caminho com o grupo de Silvino, recebendo algumas bordoadas e ficando com diversos objectos quebrados que comprara na feira."

    Esta foi a notícia que nos mostra uma possível rota da fuga de Antônio Silvino e seu bando. A seguir, vejamos um cenário da comunidade de Serra dos Bois:

    Casa que pertenceu a Ludugero da Cunha Porto- Arquivo pessoal

    Situado na divisa estadual, o povoado de Serra dos Bois localiza-se no lado pernambucano da fronteira, já no município de Taquaritinga do Norte, que à época era designado apenas como "Taquaretinga". Ao norte do mesmo, temos o sítio Barrocas, já no atual território paraibano de Barra de São Miguel. 

    O registro desta fotografia é do ano de 2016, com destaque para uma residência já existente no período da ação destacada pelo Jornal Pequeno, de 1907. Em relatos de moradores da região, o convívio e a passagem de cangaceiros, como Antônio Silvino, ainda é tema das conversas que os habitantes atuais escutaram de seus pais, avós e bisavós.

    O advogado Antônio Martins de Farias, morador de Serra dos Bois, nos informa que a referida residência é uma das mais antigas da comunidade e era propriedade de seu bisavô, o sr. Ludugero da Cunha Porto, casado com a sra. Maria Zita de Jesus. Provavelmente, a edificação é dos anos finais da década de 1880, tendo em vista que uma das filhas do casal, "Lina", nasceu neste período. 

    Prosseguindo, o sr. Antônio Martins de Farias, nos traz o interessante relato que, Ludugero da Cunha Porto, também era conhecido como "Padrinho Ludugero" e faleceu em 1913. Provavelmente, era um jovem letrado no período e que, após o advento da República, em 1889 e a instituição do casamento civil  no Brasil, logo procurou também registrar sua união com a sra. Maria Zita de Jesus no cartório. Ela, conhecida por "Mãe Zita", faleceu na década de 1960.

    Em tempo, ressalto a importância dos dados apresentados, tendo em vista meu próprio envolvimento familiar com os personagens, pois, meu avô, João de França Pontes (1934-2008), filho de Amaro de França Pontes (1877-1954) e Francisca Ludgero da Cunha (1898-1990) era bisneto, pelo lado materno, do referido casal proprietário da residência que ilustra essa matéria aqui descrita. 

    Avancemos, entrelaçando os conhecimentos históricos familiares, locais e regionais.

     João Paulo França, 16 de junho de 2021

    Fonte:

    Imagem de Arquivo pessoal

    Informações do sr. Antônio Martins de Farias. 

    Jornal A Republica, Natal, 13 de fevereiro de 1907. Ano 19, nº 33

    Jornal Pequeno, Recife, quarta-feira, 06 de fevereiro de 1907. Ano 9, nº 30.

     

    Leia também: 

    Antônio Silvino em Gravatá de Jaburu, Tanque Raso e Riacho de Santo Antônio (Série Cangaço nº 3)

    Antônio Silvino em Gravatá de Jaburu, Tanque Raso e Riacho de Santo Antônio (Série Cangaço nº 3)

    Nossa série sobre as passagens do bando de Antônio Silvino por Barra de São Miguel e suas adjacências, segue com uma interessante notícia que narra atividades do cangaceiro nas localidades de Gravatá de Jaburu, atual Gravatá de Ibiapina, no território pernambucano, além de Tanque Raso e Riacho de Santo Antônio na Paraíba, tudo isto no ano de 1905. 

    Vejamos os relatos do Jornal A Província, de Recife:

    ANTONIO SILVINO

    Está residindo em Gravatá de Jaburú ou descançando um pouco de suas viagens o celebre capitão Antônio Silvino, capitão de numerosa quadrilha de gatunos e de assassinos.

    Gravatá de Jaburú pertence ao município de Taquaretinga, o que prova as sympathias de Antonio Silvino pelas terras de Pernambuco e vizinhanças da Parahyba e de outros logares onde as autoridades policiaes fornecem-lhe cavalos e armas, munições e banquetes e auxiliam gentilmente a colheita dos saques, como em Surubim, Queimadas, S. Vicente e outros pontos de recreio do bando.

    Erguem-se em Pernambuco as sete quintas do poderoso salteador que há oito annos afronta a liga de dois governos contra o seu grupo de bandidos, hontem de três ou quatro e hoje de dez ou doze e amanha de cincoenta ou cem.

    As ultimas noticias nos informam do assalto á casa de uma viúva e do roubo de joias e dinheiro de importância de mais de quatro contos de réis.

    Antonio Silvino e seus parceiros demoraram-se três dias numa fazenda no logar Tanque-fundo, Barra de S. Miguel, estado da Parahyba. Ahi exigiram do dono da propriedade um conto de rés em paga da honra da hospedagem. Recebendo apenas 600$000 esperou que o fazendeiro vendesse alguns bois para inteirar a somma fixada.

    Um dos assassinos e ladrões da quadrilha, não sabemos porque motivos – a carta de nosso informante não explica – incorreu no ódio de Antonio Silvino e foi, para exemplo dos outros, cruelmente fuzilado quando ainda o ‘capitão’ se achava em Tanque Raso.

    Executada a pena de morte, os bandidos enterraram, com a maior solenidade, o cadáver do criminoso no cemitério da capella de Santo Antonio.

    Em perseguição de Antonio Silvino, por ordem do governo da Parahyba, existia nas imediações de Tanque Raso uma força de sete praças, que ao se inteirar dessa e de outras ocorrências tomou o alvitre cauteloso de encaminhar-se para Cabaceiras e Campina Grande, pontos diametralmente opostos ao referido logarejo.

    Sahindo de Tanque Raso, Antonio Silvino e a sua comitiva dirigiram-se para Taquaretinga, e em Gravatá de Jaburu o ‘capitã’ trata de escolher outro pouso de igual segurança.

    Nazareth? Bom Jardim? Timbaúba?

    Não sabe ainda... Elle e os outros ficam tão a commode nesses municípios que vacilam na escolha para não causarem ciúmes ou desgostos.

    <... Peçam providencias, denunciem o homizio de Antonio Silvino...>

    Quem nos escreveu a carta de Taquaretinga, sem duvida ignora que nós nos extenuamos a fazer essas cousas há muitos anos e até hontem nada ainda conseguimos.

    Há poucos dias um subdelegado hospedou Antonio Silvino e mais uma dúzia de cangaceiros, deu-lhes cavalos, auxiliou-os nas extorsões de dinheiro e continua no cargo, prestando desses e de outros serviços á politica que felizmente nos governa.

    Resigne-se o nosso missivista: se a quadrilha de Antonio Silvino bater-lhe a porta despeje os bolsos e a gaveta e depois morra de um tiro ou de dez facadas.

    A policia de Pernambuco e a policia da Parahyba não marcham ás nossas ordens nem ás ordens dos que vivem em continuo sobresalto a receitar as visitas de celebre ‘capitão’."

    O relato é bastante minucioso e cita não só os locais de passagem e moradia do bando, como aponta para as proteções e "acoitamentos" que o mesmo recebia na região. Apreciemos uma visão geral de Tanque Raso:

    Vista da região do Povoado de Tanque Raso

    Inserimos esta visão a partir do Google Maps, para indicar a proximidade e divisa que os atuais municípios de Riacho de Santo Antônio e Barra de São Miguel fazem nesta região paraibana que à época pertenciam ao município de Cabaceiras. Por sua vez, a localidade fica a poucos quilômetros do atual Distrito de Gravatá de Ibiapina, já em Taquaritinga do Norte, Pernambuco. Em 1905, ainda era conhecido por Gravatá de Jaburu, um nome que remetia a um riacho local. Tendo em vista as obras sociais do Padre Ibiapina, no século XIX na localidade, o poder público renomeou o distrito, homenageando o referido religioso.

    João Paulo França, 07 de junho de 2021

    Fonte:

    A PROVÍNCIA. Recife, sábado 18 de novembro de 1905. Ano 28, nº 260, p. 1.
    Google Maps. Print de imagem com adaptação da localidade de Tanque Raso.  
     
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