Nesta data em que o Nordeste se transforma em um grande palco em homenagem a São João, voltamos nosso olhar para o município de Barra de São Miguel, Paraíba, e procuramos encontrar um pouco desta tradição em suas comunidades.
Entre os santos juninos, São João é o mais festejado e no município é o padroeiro do Distrito de Riacho Fundo, que fica às margens do Rio Paraíba, já na Bacia do Açude Epitácio Pessoa.
Para conhecer um pouco da história deste Distrito e da devoção à São João Batista, recorremos as fontes disponíveis até o momento. Vejamos a imagem do padroeiro de Riacho Fundo:
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Imagem 1 - São João de Riacho Fundo. |
Sem dúvidas, uma das personalidades que mais eram identificadas como conhecedora da história da Comunidade de Riacho Fundo era a professora Beta. Em 1999 a mesma escreveu um interessante relato, que o transcrevemos a seguir. Vejamos uma imagem da querida professora e seu texto:
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Imagem 2 - Professora Beta |
Eis o texto:
Fundação de Riacho Fundo -
1918
Sei muito pouco a esse
respeito. Os dados que pude captar são um pouco evasivos. Sei apenas, que Riacho
Fundo foi fundado no ano de 1918, pelo então saudoso “Eduardo de Sousa Rolim”,
um homem íntegro, dotado de uma personalidade austera e muito forte, apesar de
não ter instrução.
Fundou esse lugar
construindo em primeiro plano: a casa que é hoje do seu filho Adauto Rolim. Só
que antes, nessa casa funcionou um vapor, tipo fábrica, para descaroçar algodão.
Essa invenção de vapor é muito arcaica, mas existiu. Era uma máquina manual,
mas de grande utilidade, pois na época o trabalho era todo manual, a tecnologia
só veio há pouco tempo atrás. Em seguida construiu essa habitação, a que hoje
chamamos de “Casa Grande”, pois ela é a maior de todas, histórica, não por
riquezas materiais e sim por sua “história”. Essa casa conta tudo que nos
interessa. Aqui vieram os nossos antepassados. Nela foram abrigadas pessoas
muito carentes, que vieram de vários lugares, até mesmo de Pernambuco, nosso estado
vizinho. Após a “Casa Grande” foi construída outra casa, onde foi fundada a
primeira casa de negócio, a qual naquela época chamávamos de Mercearia. A “Casa
Grande” teve uma grande família, que hoje é ainda considerada a maior entre
todas as famílias que existe. Ela é considerada a grande família. Família essa,
que está espalhada por várias partes do nosso país, como por exemplo, Nordeste,
Sudeste, como Rio, São Paulo, etc. Filhos, netos, bisnetos, tios, sobrinhos...
Riacho Fundo teve início
como um sítio, depois tornou-se uma fazenda. Com o passar dos tempos (ou
décadas) tornou-se um arraial, porque nele existia apenas uma família, “a
Família Rolim”. Depois foram se misturando as famílias, daí foi criado o
povoado, Vila e atualmente é considerado um Distrito ainda não oficializado
pertencente ao município de Barra de São Miguel, a nossa cidade. Anteriormente,
pertencíamos ao município de Cabaceiras, mas depois foi desmembrado e formado o
município de Barra de São Miguel.
Na década de 40 foi
fundada uma capela, que tem como patrono, a imagem de São João Batista, o nosso
padroeiro. Essa imagem foi doada pelo nosso saudoso Padre Inácio Cavalcante de
Albuquerque, que veio de São João do Cariri, a cidade mais antiga e mais
histórica do cariri, aqui na Região Nordeste. A capela foi fundada no ano de
1947 e o seu primeiro [DOCUMENTO CORTADO] dade de Cabaceiras, para construir
essa obra. Infelizmente ele não teve tempo de concluir, pois antes disso, ele
viera a falecer de um ataque cardíaco. Fora dormir bem e ao acordar estava morto,
falecera durante a noite.
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Imagem 3 - Relato da Professora Beta |
As pessoas que mais contribuíram
para edificar essa obra foram, sem dúvidas: Nenem Rolim, filha de Eduardo de Sousa Rolim que também já
falecera e a nossa professora Cicelina Gomes de Lacerda, (Vulgo Cilé Gomes) que
veio da cidade de Boa Vista, que na época pertencia a Campina Grande. Ela veio
para aqui se sediar e aqui lecionar, no ano de 1937, onde permanecera durante
14 anos.
A capela foi construída
também com a ajuda de todos os habitantes daqui e de outros setores
circunvizinhos, também em 1947 foi fundado o Cemitério de São Vicente de Paula
tendo como encarregado, o então saudoso Severino Pereira Maia, mais conhecido
por Severino Paulino, onde se abrigam os mortos, não somente daqui, mas de
lugares circunvizinhos. O primeiro morto a se sepultar aqui foi um senhor de um
sítio aqui vizinho que se chamava João Rodrigues, mas que o chamavam de João
Preto.
O fundador daqui falecera
no dia 22 de junho de 1937, picado por uma cobra venenosa, a cascavel. Morrera prematuramente,
nos deixando uma lacuna impreenchível.
Esses foram os únicos
dados que pude colher.
Narradora: Bernadete Maria
do Bonfim Azevedo (Beta)
Riacho Fundo, 18. 02. 99
Com muito carinho para o
primo Belarmino Mariano C. do Bomfim
Sem dúvidas, esta é uma interessante fonte para o conhecimento da história da comunidade. Ressaltamos que transcrevemos o documento em sua integralidade, o que não o torna uma "verdade absoluta", apenas faz interessantes apontamentos para novas pesquisas. Entre as correções necessárias, destacamos que desde 1976, Riacho Fundo já era um Distrito, reconhecido inclusive através da Lei Estadual nº 3.892/76 (Veja Matéria neste Link AQUI). Vejamos a seguir algumas imagens de cenários e personagens apontados pela sra. Beta:
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Imagem 4 - A "Casa Grande" |
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Imagem 5 - A Igreja de Riacho Fundo |
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Imagem 6 - Cemitério São Vicente |
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Imagem 7 - Professora Celecina |
Além desta fonte oral, representada pelas palavras escritas da professora Beta, em 1985, o Padre Léo Dénis de Cabaceiras lançou a obra "Cabaceiras 1835-1985" e na mesma consta a seguinte informação sobre a comunidade e a devoção católica à São João Batista:
Fundação da Capela de
Riacho Fundo (Texto fornecido por
Oseni Bonfim)
Eduardo Rolim e Ana da
Conceição foram quem deram início à fundação de Riacho Fundo, mais ou menos no
ano de 1918.
Morrendo este no ano de
1937, a capela foi iniciada sua construção no ano de 1943 pela comunidade
tirando esmolas.
Foi dado o nome de Riacho
Fundo por haver bem próximo um riacho muito fundo, por onde passava a estrada
antiga. Os meios de transporte eram cavalo e caminhão.
Criava-se gado, jumento e
cabra. Cultivava-se o milho, o feijão, o algodão, o jerimum e a batata, que
eram transportados em burros para serem vendidos na cidade de Campina Grande
por tropeiros.
Havia também na época um
motor a vapor para descaroçar algodão, que pertencia ao senhor Eduardo Rolim.
Ele negociava em tecidos, feijão, algodão, milho e gado.
Riacho Fundo fica às
margens do Rio Paraíba que derrama suas águas no açude Epitácio Pessoa. Este
açude teve sua primeira enchente no ano de 1957, mas só em 1961 é que veio
favorecer os agricultores da região com a sua maior enchente, obtendo-se
maiores lucros.
Em 1971 foi plantado o
primeiro plantio de tomates, dando com isso mais oportunidades de emprego a
muitos pais de família, que não tinham como ganhar o pão de seus filhos.
Já em nossos dias
planta-se o pimentão, a cenoura, a beterraba, a cebola e outras verduras, que
são entregues nas Ceasas de Campina Grande, João Pessoa e Recife. (DÉNIS, 1985,p. 52)
Não temos maiores informações acerca das fontes de Oseni Bonfim, porém, fica evidente que sua descrição se aproxima bastante das descrições prestadas pela professora Beta, na correspondência que a mesma guardava consigo que transcrevemos inicialmente. Cremos que uma fonte complementa a outra, obviamente com ambas necessitando de maiores detalhes e confirmações.
Por fim, entre os dados mais recentes, destacamos trecho da obra "O Antigo Termo de Cabaceiras", em que o Padre João Jorge Rietveld faz a seguinte anotação sobre a comunidade:
1949 – Capela de São João Batista de Riacho Fundo
A primeira vez que a
capela de Riacho Fundo foi registrada num batismo no dia 03 de julho de 1949.
Padre Léo resgatou uma parte de sua história. “Eduardo Rolim e Ana da Conceição
foram quem deram início à fundação de Riacho Fundo, mais ou menos no ano de
1918. Morrendo este no ano de 1937, a capela foi iniciada sua construção no ano
de 1943 pela comunidade tirando esmolas. Foi dado o nome de Riacho Fundo por
haver bem próximo um riacho muito fundo, por onde passava a estrada antiga”. A
capela foi dedicada a João Batista (RIETVELD, 2017, p. 299).
Desta fonte destacamos a informação acerca deste ano de 1949, em que a Igreja de Riacho Fundo já passa a figurar nos documentos oficiais da Matriz de Cabaceiras.
Certamente a história religiosa, cultural e econômica desta importante comunidade ainda está por ser escrita. Que novos desbravadores possam assumir esta tarefa é o nosso desejo. Por hora, saudemos Riacho Fundo, saudemos o São João e caminhemos sempre nesta busca pelo melhor conhecimento do patrimônio material e imaterial desta região.
João Paulo França, 23 de junho de 2020.
Fonte:
DÉNIS, Léo. Cabaceiras 1835-1985. Cabaceiras, s/e, 1985.
RIETVELD, João Jorge. O Antigo Termo de Cabaceiras". Queimadas: Cópias e papéis, 2017.
Imagem de rede social da Comunidade "Riacho Fundo" do Facebook
Imagem de rede social da Paróquia de São Miguel Arcanjo de Barra de São Miguel.
Imagem de rede social de Florêncio Bonfim Costa Leonardo.